Saúde

O complexo sistema digestivo

O gastroenterologista Carlos Henrique Arruda Salles, 38, é chefe da Unidade de Atenção em Especialidades Cirúrgicas do Hospital Universitário Júlio Muller e preceptor do Programa de Residência Médica em Coloproctologia.  Membro da equipe de Cirurgia Oncológica da Oncocenter, formou-se em Medicina pela Universidade Federal de Mato Grosso em 2007. Em 2012, fez Residência Médica em Cirurgia Geral pela Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Já em 2014, a Residência Médica em Cirurgia do Aparelho Digestivo. Mestrando do Programa de Pós-graduação em Atenção Hospitalar do Hospital Universitário Júlio Muller; Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva – CBCD e Membro da Sociedade Brasileira de Atenção Integral ao Trauma – SBAIT. Nesta entrevista, o especialista explica as principais disfunções funcionais do sistema digestivo. Também reforça que a boa alimentação, atividade física, controle de peso e o aumento do consumo de água, perpassa por quase todos os mecanismos de tratamento das doenças do aparelho digestivo. Confira!

Blog da Condessa – De uma maneira geral, quais a especificidades da atuação de um especialista em  Gastroenterologia?

Carlos Henrique Arruda Salles – O Gastroenterologista atua nas doenças do aparelho digestivo, como gastrite, refluxo gastro-esofágico, intolerâncias alimentares, doenças inflamatórias intestinais, entre outras.

Blog da Condessa – Quais os principais acometimentos do sistema digestório podem ser identificados e tratados pelo especialista em Gastroenterologia?

Carlos Henrique Arruda Salles –  As principais queixas que levam o paciente ao consultório do gastro são as relacionadas aos distúrbios de acidez como a gastrite, úlcera, infecção pelo Helicobacter pylori, doença do refluxo gastro-esofágico, investigação de diarreias funcionais ou não, investigação e tratamento de constipações intestinais, entre outras.

Blog da Condessa- Quando procurar um especialista?

Carlos Henrique Arruda Salles – A necessidade surge quando o paciente tem sintomas recorrentes de má digestão (plenitude pós-prandial), queimação (pirose), estufamento (distensão abdominal), ou mesmo nas diarreias que persistem por mais de 15 dias, nas constipações intestinais com mais de cinco dias sem evacuar, bem como com fezes endurecidas.

Blog da Condessa – Quais os principais exames realizados para o diagnóstico preciso de doenças gastroenterologicas?

Carlos Henrique Arruda Salles – Os exames mais solicitados são a endoscopia digestiva alta, a colonoscopia e os exames de imagem. Sendo a maioria das vezes um Ultrassom de abdome ou, em casos específicos, a tomografia de abdome. Lembrando que cada um tem sua necessidade e especificidade.

Blog da Condessa – Comente, por favor, sobre o quadro de diverticulite.

Carlos Henrique Arruda Salles  – A diverticulite é uma inflamação de umas pequenas saculações, ou divertículos, que se formam no intestino, especialmente com a idade. É importante ressaltar que aqui me atenho apenas a diverticulite do intestino grosso, porque podem existir divertículos em outras partes do intestino e esôfago com outras complicações e desfechos.

Blog da Condessa – Qual a causa?

Carlos Henrique Arruda Salles – A causa mais comum é a obstrução por fezes endurecidas, causando “entupimento” do divertículo. Como o intestino, de modo geral, secreta muco, ele se represa e pode causar um aumento na pressão dentro desse divertículo que leva, em última instância, a inflamação. Além disso, há também  proliferação de bactérias patológicas de maneira anormal transformando o processo inflamatório em uma infecção, com formação de pús. A evolução natural, caso nada seja feito, é romper o divertículo inflamado para a cavidade abdominal, espalhando infecção por todo o abdome.

Blog da Condessa – É mais comum em pessoas a partir de que idade?

Carlos Henrique Arruda Salles – A doença diverticular dos cólons ocorre com maior frequência a partir de 60 anos, ou seja, mais comum nas idades mais avançadas, podendo chegar a mais de 80% de prevalência nas populações acima de 80 anos. Já a inflamação depende de outros fatores, em especial o ritmo intestinal da pessoa.

Blog da Condessa – Quais os sintomas?

Carlos Henrique Arruda Salles – O principal sintoma relacionado à diverticulite é a dor em região inferior esquerda do abdome, podendo haver ainda enjoo, vômitos, febre, mal estar, perda do apetite, entre outros. Regra geral, a diverticulite aguda é tratada com antibióticos a depender da sua repercussão. Caso o quadro esteja limitado a região da inflamação, o antibiótico e, eventualmente, um repouso intestinal por alguns dias, se faz necessário. Em casos mais graves, a cirurgia para retirada do segmento acometido pode ser necessária, especialmente quando há rompimento do divertículo com extravasamento de fezes para a cavidade abdominal.

Blog da Condessa – Pesam os hábitos alimentares? 

Carlos Henrique Arruda Salles – Os hábitos alimentares podem interferir no hábito intestinal, e este sim ser fator de risco para a agudização de um quadro inflamatório.

Blog da Condessa – Que alimentos evitar para quem tem diverticulite?

Carlos Henrique Arruda Salles – Como a diverticulite é um quadro agudo, normalmente o paciente fica em dieta zero por um ou dois dias, retornando com dieta oral gradualmente, conforme aceitação.

Blog da Condessa – Por que algumas pessoas estão mais sujeitas a formar divertículos?

Carlos Henrique Arruda Salles – Há que se distinguir a diverticulose, da doença diverticular e da diverticulite. Diverticulose é a presença de divertículos no intestino grosso. Já a doença diverticular, é a presença de sintomas secundários aos divertículos intestinais. E a diverticulite é a inflamação de uma dessas saculações que se formam no intestino. A formação do divertículo é um processo que se dá pela fragilidade da parede do intestino, em especial nas regiões de entrada de vasos sanguíneos onde naturalmente há pontos podem se tornar fracos, com o “extrasamento” da mucosa do intestino pela parede muscular do cólon. Esse processo de enfraquecimento se dá seja pela força de contração que o intestino faz para manter o processo de peristalse, seja pela idade, que é um fator de risco para o surgimento dos divertículos.

Blog da Condessa – A diverticulose faz parte do envelhecimento normal como as rugas e os cabelos brancos?

Carlos Henrique Arruda Salles  – Sem dúvida. A partir de 50/60 anos, já aumenta a frequência de pessoas portadoras de divertículos no intestino grosso.

Blog da Condessa – Qual seria a quantidade ideal de fibras a ser ingerida? 

Carlos Henrique Arruda Salles  – Se mensurarmos isso em porções, seria algo em torno de 6 a 8 porções ao dia – de 25 gramas de fibra ao dia.

Blog da Condessa – Medicamentos podem provocar a doença?

Carlos Henrique Arruda Salles – Algumas medicações aumentam o risco, como os antiinflamatórios, tipo naproxeno, cetoprofeno, diclofenaco, porque eles atuam irritando a mucosa intestinal.

Blog da Condessa – Que conduta se deve adotar diante da suspeita de diverticulite?

Carlos Henrique Arruda Salles  – Diante do quadro de dor em andar inferior à esquerda do abdome, perda de apetite, eventualmente, sangramento nas fezes, há necessidade de procurar assistência médica para avaliação do quadro e ver a necessidade de um tratamento específico.

Blog da Condessa – O que registra a colonoscopia?

Carlos Henrique Arruda Salles – A colonoscopia prévia avalia a presença dos divertículos, antevendo a possibilidade de alguma complicação. Já a colonoscopia realizada após a inflamação, ou seja, a diverticulite aguda, visa avaliar se o quadro é decorrente apenas da inflamação do divertículo, ou se há algum outro problema associado. Lembro que essa colonoscopia realizada após a inflamação, não pode, ou não deve ser realizada na vigência de um processo inflamatório agudo pelo risco de perfurar durante o exame, caso isso não tenha acontecido.

Blog da Condessa – Há indicação cirúrgica, evoluiu o método? Em que casos? 

Carlos Henrique Arruda Salles – A indicação cirúrgica na fase aguda ocorre quando há uma perfuração do divertículo com pús e fezes espalhando na cavidade abdominal. Alguns pacientes são submetidos a procedimento operatório mais tardio, em virtude de complicações locais que podem ocorrer devido o processo inflamatório como fístulas abdominais, que é uma comunicação anormal entre partes do intestino, ou entre o intestino e a pele. Também pode ocorrer um estreitamento da parte interna do intestino, a luz intestinal, que pode causar obstrução do trânsito intestinal com necessidade de retirar aquela parte afetada para reestabelecer o fluxo das fezes.

Blog da Condessa – Qual a orientação aos pacientes que tiveram a primeira crise e não responderam bem ao tratamento clínico?

Carlos Henrique Arruda Salles – A primeira orientação é sempre melhorar o hábito intestinal, ingerindo mais alimentos com fibra e aumento do consumo de água. Isso favorece o amolecimento das fezes reduzindo o principal fator de risco para os quadros de agudização, que é a constipação intestinal, fezes endurecidas. Outra medida de extrema importância é a atividade física diária por pelo menos 40min. A atividade física auxilia na motilidade intestinal na medida que funciona como um massageador natural do intestino. A perda de peso também contribui para reduzir o risco de novo evento de inflamação. Fazendo isso há uma importante redução na possibilidade de novo evento agudo.

Blog da Condessa  – Comente, por favor,  sobre os avanços da especialidade gastro.

Carlos Henrique Arruda Salles  – A especialidade vem numa crescente em termos de tratamento de doenças comuns como a doença do refluxo gastro-esofágico, mesmo para obesidade, tanto para o tratamento clínico como cirúrgico, seja operatório, seja minimamente invasivo, passando por melhorias de medicações, incorporação de técnicas, até novas tecnologias de exames e cirurgia.

Blog da Condessa – Dicas de prevenção de doenças do aparelho digestivo. 

Carlos Henrique Arruda Salles – A tríade, boa alimentação, atividade física e controle de peso, e aumento de consumo de água, perpassa por quase todos os mecanismos de tratamento das doenças do aparelho digestivo.

Blog da Condessa – Como está convivendo como médico na pandemia?

Carlos Henrique Arruda Salles – O momento atual melhorou muito, mas no auge da pandemia, por trabalhar num hospital que se tornou referência para atendimento de casos graves de COVID, foi bastante difícil. Primeiro porque houve uma necessária readaptação de vida, uso contínuo de máscara no ambiente hospitalar, prosseguindo para o ambiente fora do mesmo, o afastamento das pessoas, achando que poderiam pegar a doença só de estar perto de pessoas que trabalham com COVID, e mesmo dentro de casa, mudando rotina. A melhor coisa que havia era chegar em casa e receber abraços e beijos dos familiares, foi trocado por “espera que vou tomar um banho primeiro!”. As crianças ficaram bastante assustadas e receosas. A família também era bastante reticente. Foi bem difícil. Graças a Deus, já passamos o olho do furacão e caminhamos mais leve agora.

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