Cultura

A soma de diversas e densas experiências culturais

O historiador João Carlos Vicente Ferreira, 66, é escritor da Editora Memória Brasileira e editor da revista Lume MT. Natural do Paraná,  reside em Mato Grosso desde 1990 e de lá pra cá promoveu diversas ações voltadas aos estudos da cultura e história sócioeconômica do Estado. Em Mato Grosso é considerado uma das mais eminentes personalidades na área cultural. Sua trajetória intelectual e cultural, de reconhecido percurso, teve início no estado paranaense e segue como defensor ferrenho da memória e do Patrimônio Histórico de Mato Grosso e do Brasil. Nesta entrevista exclusiva ao blog da Condessa, o historiador e escritor discorre sobre a soma de suas experiências culturais no contexto atual, da relevância da leitura, sobre sua produção de livros relacionados à área de história desde 1993 e de seu profundo conhecimento de todos os meandros da questão cultural em Mato Grosso, entre outros. Confira!

Blog da Condessa – O senhor é historiador, escritor – membro da Academia Mato-grossense  de Letras-, e ex-gestor da Secretaria de Estado de Cultura?

João Carlos Vicente Ferreira – Sou membro efetivo da Academia Mato-Grossense de Letras, cadeira nº 27, e membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de MT, do qual fui presidente em seis mandatos. Fui Secretário de Estado de Cultura de 2004 a 2007, onde desenvolvi intenso projeto de recuperação do patrimônio histórico de Cuiabá e de cidades históricas do interior do estado, a exemplo de Vila Bela da Santíssima Trindade, Diamantino, Santo Antônio de Leverger, Barão de Melgaço, Poconé, Barra do Garças, Cáceres e dezenas de outros municípios. Criei a Literamérica, Feira Sul Americana do Livro (2005-2006), com 200 mil visitantes. Recuperei a ponte de ferro do Rio Coxipó e todas as igrejas que estavam necessitando de intervenção, a exemplo da Nossa do Bom Despacho, do Rosário, Senhor dos Passos, da Guia, Palácio da Instrução, Cine Teatro Cuiabá e Museu Histórico de MT. Também recuperamos inúmeros casarões históricos, bem como as estações telegráficas construídas pelo marechal Rondon por ocasião do centenário da implantação das linhas telegráficas estratégicas, em MT ao Amazonas, em 2007. Criei a orquestra de Mato Grosso e convidei o músico Leandro Carvalho para regê-la.

Blog da Condessa – A soma de todas essas experiências culturais resultou em um João Carlos Vicente Ferreira ?

João Carlos Vicente Ferreira – A soma de todas essas experiências culturais resultou em um João Carlos Vicente Ferreira que conhece profundamente todos os meandros da questão cultural em MT. Além do que, fui o primeiro secretário de estado de Cultura a presidir o Fórum Nacional de Cultura – uma instituição criada para pensar a cultura brasileira. Tive permanentes reuniões com artistas de renome nacional e com os ministros de cultura Juca Ferreira e Gilberto Gil, além de ministros de outros países.

Blog da condessa – Por favor, comente sobre suas obras.

João Carlos Vicente Ferreira – Escrevo livros relacionados à área de história desde o ano de 1993. Meu primeiro trabalho foi MATO GROSSO – POLÍTICA CONTEMPORÂNEA. Depois escrevi BREVE HISTÓRIA DE MATO GROSSO E DE SEUS MUNICÍPIOS em parceria com Paulo Pitaluga Costa e Silva, renomado historiador. Também dividi com outro importante historiador a assinatura do livro CIDADES DE MATO GROSSO – ORIGEM DE SEUS NOMES, com o padre José de Moura e Silva que muito me ensinou e orientou. A minha referência está no livro MATO GROSSO E SEUS MUNICÍPIOS, obra escrita e publicada em 1997, com duas reedições. É um livro que se tornou importante para muita gente, notadamente vestibulandos e alunos em fase de produção de artigos e teses.

Blog da Condessa – Há alguma obra em andamento pra este ano ainda ou 2021?

João Carlos Vicente Ferreira  – Sim, existem pelo menos 12 títulos que estou produzindo neste 2020. Devo publicar pelo menos três títulos.

Blog da condessa –  Em 2019, depois de um  longo período fechado,  o Museu de Arte Sacra de MT é reaberto ao público totalmente revitalizado. Qual a importância do fato e o que representa pra sociedade?

João Carlos Vicente Ferreira – O Museu de Arte Sacra está em atividades por minha iniciativa enquanto secretário de Estado. Recuperei o prédio do antigo seminário com recursos que consegui na iniciativa privada. O acervo do museu estava literalmente “jogado”, com cocô de pombo em cima de altares e móveis pertencentes a Dom Aquino. Contratei um bom técnico em restauração, o senhor Ariston de Souza e demos início a um trabalho hercúleo. Conseguimos êxito. No entanto, eu não fui o secretário que entregou a obra. Por conta disso não foi reconhecido o trabalho feito. Mas assim é que funciona a vida pública de um gestor. Não tivesse a nossa ação, muito provavelmente não teríamos hoje o museu como ele é.

Blog da Condessa – Há algum livro premiado? Caso afirmativo, o que significa/ representa esse prêmio para a literatura de Mato Grosso?

João Carlos Vicente Ferreira –  Não tenho livro premiado, porque nunca participei de concursos literários e nada parecido. Acho importante que as pessoas que militem nessa área o façam. Como minha área é na maior parte das vezes de história, não entro no clima ‘glamourizado’ da literatura. Apesar de que, tenho livros na área da etimologia e toponímia de suma importância para se conhecer a língua portuguesa. Meus livros de romance ainda não foram publicados.

Blog da Condessa – Por favor, sugestões de leituras.

João Carlos Vicente Ferreira – Ler, ler, ler e ler, não interessa o tipo de leitura. Todos são importantes. A junção de muitas formas de leitura é que nos possibilita sermos pessoas mais cultas e conhecedoras do universo, como um todo.

Blog da Condessa – Na sua opinião, sinônimo de ler é?

João Carlos Vicente Ferreira – Conhecimento. A leitura estabelece uma íntima relação com o texto lido, permitindo-nos compreendê-lo e interpretá-lo. Por conta disso, a leitura é um convite à liberdade de expressão de sentimentos. É ali que descobrimos e compreendemos melhor as nossas próprias emoções.

Blog da Condessa – O confinamento doméstico imposto pela pandemia do novo coronavírus estimulou a leitura?

João Carlos Vicente Ferreira – Certamente que sim, em algum momento do confinamento as pessoas deixaram de comtemplar telas de smartphones e tvs e voltaram-se à leitura.

Blog da Condessa –  Quem lê amplia o olhar, torna-se mais tolerante ao perceber na visão do outro formas de alargar a sua própria visão das coisas. Quem lê, consegue ter uma percepção mais crítica de tudo. Concordas?

João Carlos Vicente Ferreira – Concordo plenamente com essa afirmativa. As pessoas, de forma em geral, que se dedicam à leitura como forma de busca de conhecimento, as obtém, sem dúvida alguma. O bom de tudo isso é que uma coisa puxa a outra, ou seja, nos livros você tem o nome do autor ou autora e também as referências bibliográficas, oras, quem não dá uma “sapeada” em outros títulos? É um caminho a ser percorrido, se você gostou de certo autor, ou autora, você irá, sem dúvidas, em busca de outros escritos desse cidadão. É ali que começa a relação entre o leitor e o escriba, o qual, muitas vezes, é um eterno companheiro, por ser uma referência e uma inspiração.

Blog da condessa – Que ações você considera válidas para ampliar o acesso ao livro, à cultura, arte?

João Carlos Vicente Ferreira – A cultura de forma em geral é muito pouco consumida pelo povo brasileiro. A culpa disso é dos governos: municipais, estaduais e da União. Por que isso? Oras o governo tem a grana dos impostos de toda a nação e tem a obrigação de investir em cultura, e não o faz. Quando faz, geralmente faz mal feito. Os livros tinham que receber mais incentivos para serem publicados. Da forma que está atualmente, pelo menos em Mato Grosso, é ridícula. É pouco. Pouquíssimo. Estamos descobrindo em cada esquina de nossas cidades, a cada dia que passa, mais e mais bons escritores. E daí?  O governo que tem recurso que não veio do bolso dele, e sim do nosso, não faz a sua parte. Mas isso tem nome: incompetência.

Blog da Condessa – Estavas com projetos em andamento, antes de iniciar o distanciamento social?

João Carlos Vicente Ferreira – Sim, estava com vários projetos. Alguns não foram afetados, como a produção de livros. No entanto, fui prejudicado num projeto de música que estava programado para o mês de março no cine Teatro Cuiabá. É um projeto que teve que ser adiado.

Blog da Condessa – Quando e como foi a sua estreia como escritor?

João Carlos Vicente Ferreira – Escrevi sempre em minha vida. No entanto, a publicação de um livro se deu no começo da década de 1990. Não havia priorizado escrever como forma de profissão, hoje é. Sou um profissional da escrita, com encomendas de livros e tudo o mais. No entanto, existem os títulos que produzo por minha livre iniciativa, alguns romances, livros biográficos, entre outros.

Blog da Condessa – O que mais te fascina na cultura?

João Carlos Vicente Ferreira  – A cultura da nação brasileira é rica e diversa. Em Mato grosso não é diferente. Tudo me encanta na cultura. Desde o casario colonial, igrejas e casas seculares até a arquitetura moderna nas nossas cidades> A dança do siriri, herança de Portugal (o original, sem alterações), a música representada pelo rasqueado cuiabano e de fronteira. Também o teatro, a literatura e o cinema crescente. São muitos bons os novos diretores e roteiristas, além de bons atores e atrizes. Enfim, a nossa cultura é muito diversificada. Falta o próprio mato-grossense conhecê-la melhor.

Blog da Condessa –  Na sequência, o que comemorar?

João Carlos Vicente Ferreira – Comemoremos a vida. Não viemos a esse mundo para passear, cada um tem o seu motivo de vida e deve cumprir a sua etapa de atividades aqui na terra. Quem não se dispõe a atuar e entra em sintonia menor por uma pandemia não vai honrar a história de Mato Grosso. Senão o que dizer dos seis mil mortos com a epidemia da varíola, em Cuiabá, em 1867? Que veio com a Guerra do Paraguai? Nessa época Cuiabá tinha 12 mil habitantes. Morreu a metade. É pouco? E a gripe espanhola que judiou extremamente de nossa gente? Oras, não podemos desanimar, vamos dançar conforme a música da Covid-19. Lamentemos nossos mortos. Muitos poderiam estar aqui, lendo essa matéria. Muitos foram mal informados ou, infelizmente, era a sua hora.

Blog da Condessa – Vivemos excepcionalmente devido ao isolamento social um momento de leitura?

João Carlos Vicente Ferreira –  Certamente o isolamento social propiciou, empurrou muita gente à leitura. Esse é um lado bom da pandemia. No entanto, não durou muito. Para muitos, o suficiente para descobrir a importância de deitar os olhos numa folha de livro.

Blog da Condessa – Qual é o teu estilo/preferência?

João Carlos Vicente Ferreira-  Não tenho preferência. Li muito gibi na minha infância, também lia fotonovelas. Entretanto, tinha tias professoras e que possuíam um bom acervo literário. Isso me induzia a leitura de várias áreas e estilos, pois uma tia era professora de história e a outra de português.

Blog da Condessa – Como se dá o seu processo de criação, inspiração?

João Carlos Vicente Ferreira – O processo de criação e inspiração é permanente e acontece a qualquer momento do dia ou da noite (vale sonhar também). Prefiro trabalhar pela manhã, rendo mais.

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