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Guarda compartilhada não é uma operação matemática

O Código Civil Brasileiro prevê apenas duas modalidades de guarda: a guarda unilateral, consistente no exercício exclusivo e prioritário das responsabilidades parentais e a guarda compartilhada, na qual as responsabilidades são divididas entre os genitores.

Desde que a guarda compartilhada começou a ser aplicada no ordenamento jurídico, o entendimento era de que importava na responsabilização e no exercício conjunto de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto. Fixada uma residência de base, na qual os filhos teriam estabelecido seu cotidiano, seu ambiente, o poder de decisão era conjunto. A guarda compartilhada não pressupõe que a criança ou adolescente tenha duas casas, alternando sua morada ora na casa da mãe, ora na do pai.  Alguns juristas defendem que tal alternância retiraria do menor a sua referência espacial. Essa alternância de residências seria, portanto, característica da guarda alternada, que não tem previsão na legislação brasileira.

As discussões a respeito da guarda compartilhada continuaram e sua aplicação continuou sendo alvo de divergências. Em dezembro de 2014, a guarda compartilhada foi estabelecida como regra no ordenamento jurídico, independente de consenso entre os pais e independente do local de suas residências. O objetivo da lei foi o de afastar equívocos na interpretação da guarda, para que os pais possam partilhar um com o outro as responsabilidades com o sustento, educação e convívio com os filhos de forma direta e conjunta.

A guarda compartilhada que aplicada atualmente significa que os pais, de forma conjunta, tomarão as decisões quanto à escolaridade, saúde, lazer e demais providências inerentes à vida de seus filhos. A fixação da residência é independente do compartilhamento de tais decisões e atenderá ao melhor interesse dos filhos.

Na guarda compartilhada haverá, portanto, o compartilhamento das decisões, mesmo fixada a base da residência com um dos genitores. E podemos acrescentar que não há necessidade de contato diário entre os pais, o que na maioria das vezes é complicado após o término do relacionamento. A ideia é de que haja compartilhamento de decisões estruturais, como o estabelecimento escolar, plano de saúde, terapia e esportes, por exemplo.

A divisão do tempo de convívio dos pais com os filhos não será, portanto, uma operação matemática. A lei prevê que o tempo de convívio entre os pais e os filhos deve ser fixado de forma equilibrada, buscando afastar a fixação de meros finais de semana alternados e dependerá da análise de cada caso.

Na prática, em muitos casos que chegam ao Poder Judiciário, os pais definem finais de semana alternados para que tenham, cada um, tempo de lazer com a criança e tempo de lazer sem a criança (enquanto a criança está com o outro genitor), bem como alguns encontros semanais, como um almoço ou jantar durante a semana. Outras possibilidades são: um genitor leva a criança na escola e o outro busca, um dos genitores leva nas atividades extracurriculares (futebol, natação), por exemplo. O que se pretende é a divisão e compartilhamento das decisões e informações a respeito da criança, ao mesmo tempo que uma proximidade da criança com ambos os genitores, o que não ocorre se forem fixadas visitas a cada quinze dias.

A guarda compartilhada, assim, mostra-se a mais adequada ao exercício conjunto do poder familiar, para que os pais, ainda que separados, sigam realizando, da melhor forma, suas funções parentais, sem que haja divisão estanque de tempo de convívio entre eles e os filhos. A divisão deve ser equilibrada e não igualitária, pois deve-se considerar a rotina dos pais e dos filhos. Caso a determinação da lei fosse de divisão igualitária, a moradia deveria ser fixada na casa de ambos os pais e não na que melhor atenda aos seus interesses, como previsto na lei.

* Stela Cunha Velter, advogada familiarista há mais de 25 anos, professora universitária há 18 anos, Presidente da Comissão de Direito Civil e Processual Civil da OAB/VG. Instagram: @stelacvelter 

 

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